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24 maio 2013

CORRENTISTA NÃO COTISTA DE COOPERATIVA TEM DIREITO À RESTITUIÇÃO DE VALOR DEPOSITADO EM SUA CONTA



O blog publica às sextas-feiras decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos julgados nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências. Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns, onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.

Hoje a questão abordada é a devolução de depósito de correntista não quotista de cooperativa de crédito mútuo em face de sua autodissolução, nos termos abaixo:

RECURSO INOMINADO Nº6.743/05
ACÓRDÃO
EMENTA: RECURSO INOMINADO. COOPERATIVA DE CRÉDITO EM LIQUIDAÇÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES DEPOSITADOS EM CONTA DE CORRENTISTA. PROCEDÊNCIA.
1.-PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUIZADO ESPECIAL REJEITADA, POIS DESNECESSÁRIA QUALQUER PROVA PERICIAL CONTÁBIL PARA APURAR OS HAVERES DA CORRENTISTA-RECORRIDA.
2.-PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA PELA NÃO SUSPENSÃO DO PROCESSO TAMBÉM REJEITADA, EIS QUE AUTO-DISSOLUÇÃO DE COOPERATIVA DE CRÉDITO NÃO SE ENQUADRA NAS DISPOSIÇÕES DO ART.18 DA LEI Nº 6.024/74.
3.- É DIREITO DA CORRENTISTA A RESTITUIÇÃO DE VALORES CONSTANTES DE SUA CONTA FINANCEIRA QUE NÃO SE CONFUNDE COM AS QUOTAS DE CAPITAL DE COOPERADO DE QUE CUIDA A LEI 5.764/71.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, à unanimidade, rejeitar as preliminares argüidas e, no mérito, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator que deste passa a fazer parte integrante.Vitória, ES, de agosto de 2005.

R E L A T Ó R I O

A autora compareceu pessoalmente perante o Juizado Especial alegando ser correntista da Cooperativa de Economia e Crédito Mútuo, onde fazia aplicação financeira até que a mesma foi descredenciada pelo BACEN (Banco Central do Brasil), quando requereu a restituição da importância de R$ 1.440,00 que se encontra retida nos cofres da requerida.
Através da r. sentença de fls. 83/84 o pedido foi julgado procedente, com a condenação da Cooperativa a restituir a importância de R$ 1.440,00, com correção monetária a partir do ajuizamento da ação e juros legais a contar da citação.
Inconformada, a Cooperativa interpôs recurso inominado a fls. 86/101, argüindo, em sede de preliminares, a incompetência absoluta do juizado e a nulidade da sentença, com a suspensão do processo e, no mérito, propugnou pela reforma da sentença, julgando-se improcedente o pedido formulado pela autora.
Contra-razões a fls. 115/119, rebatendo as preliminares e, no mérito, postulando a mantença in totum da sentença de piso, acrescida de honorários advocatícios.
É o relatório.

V O T O

Verificando que foram atendidos os pressupostos legais, sobremodo diante da certidão de fls.109, conheço do recurso.

PRFELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUIZADO ESPECIAL

A recorrente alega incompetência absoluta do Juizado Especial por necessidade de prova pericial contábil.

Ora, o que a autora pleiteou em juízo foi o ressarcimento de valores depositados por ela em sua conta junto à requerida. Não se trata, pois, de resgate de quotas de capital social, mas de depósitos em dinheiro feito em sua conta corrente.

Desnecessária, pois, qualquer prova pericial contábil para apuração desses valores, bastando o comprovante de recibo de depósito a prazo de fls. 06 e os extratos de movimentação financeira da referida conta-corrente por ela anexados aos autos.
Ademais, não há nos autos qualquer discussão sobre a veracidade ou quantificação do valor indicado pela recorrida.

Assim sendo, rejeito a presente preliminar.

PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA

Aduz a recorrente que a sentença é nula, vez que o processo deveria ter sido suspenso, tendo em vista que o Banco Central do Brasil, em 16.01.2003, aprovou seu ingresso no regime de Liquidação Ordinária. Desse modo, houve violação dos artigos 18 da Lei 6.024/74 e art. 76 da Lei 5.764/71.

Segundo palavras da recorrente (fls.54) “sendo a Lei 6.024/74 o instrumento normativo que regula a presente situação”, o processo deveria ter sido suspenso com base nos artigos 1º e 18. (fls.92).

Lei 6.024/74:
Art . 1º As instituições financeiras privadas e as públicas não federais, assim como as cooperativas de crédito, estão sujeitas, nos termos desta Lei, à intervenção ou à liquidação extrajudicial, em ambos os casos efetuada e decretada pelo Banco Central do Brasil, sem prejuízo do disposto nos artigos 137 e 138 do Decreto-lei nº 2.627, de 26 de setembro de 1940, ou à falência, nos termos da legislação vigente.
...

Art . 18. A decretação da liquidação extrajudicial produzirá, de imediato, os seguintes efeitos:
a) suspensão das ações e execuções iniciadas sobre direitos e interesses relativos ao acervo da entidade liquidanda, não podendo ser intentadas quaisquer outras, enquanto durar a liquidação;
b) vencimento antecipado das obrigações da liquidanda;
c) não atendimento das cláusulas penais dos contratos unilaterais vencidos em virtude da decretação da liquidação extrajudicial;
d) não fluência de juros, mesmo que estipulados, contra a massa, enquanto não integralmente pago o passivo;
e) interrupção da prescrição relativa a obrigações de responsabilidade da instituição;
f) não reclamação de correção monetária de quaisquer divisas passivas, nem de penas pecuniárias por infração de leis penais ou administrativas.

Percebe-se assim que não se aplica ao caso concreto a suspensão do processo porque não houve intervenção ou liquidação extrajudicial pelo Banco Central do Brasil, mas sim auto-dissolução da cooperativa, que é coisa diversa.
 
A liquidação ordinária ou auto-dissolução não se inclui, nem por analogia ou semelhança, como pretende a recorrente, aos casos específicos previstos na legislação supra referida.

Nesse diapasão, rejeito também esta preliminar.

M É R I T O

A sentença considerou a recorrida como simples correntista junto à cooperativa-recorrente.

Com efeito, não há qualquer elemento de prova nos autos que confirme ou negue tal afirmação.

Contudo, presume-se verossímel a asserção autoral, vez que não cuidou a recorrente de demonstrar o contrário, ônus processual que lhe incumbia, segundo os ditames do artigo 333,II, do CPC.

Nesse passo, creio que os valores reconhecidos na sentença a título de restituição devem ser confirmados.

Ademais, trata-se de uma cooperativa ampla – colaboradores da CST e empresas de siderurgia – envolvida num verdadeiro escândalo financeiro que atingiu milhares de pessoas.

O fato é de domínio público – várias cooperativas deste Estado, por gestões temerárias, quiçá fraudulentas - entraram em regime de liquidação ou intervenção ou de verdadeira quebra – causando prejuízos a milhares de pessoas. A maioria delas sócios-quotistas, portanto, vítimas da hecatombe financeira que atingiu diversas cooperativas.

Registro, por final, que em situação semelhante esta Turma Recursal no RI Nº5.283/04 decidiu no sentido do cabimento do pedido de restituição dos valores retidos dos correntistas da cooperativa-recorrente.

Por essas razões, nego provimento ao recurso para manter a a r.sentença impugnada.

A recorrente deve arcar com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 55 da LJE.

É como voto.

13 maio 2013

NOS MODELOS CONSENSENSUAIS AUTOCOMPOSITIVOS (CONCILIAÇÃO, MEDIAÇÃO) NÃO HÁ PRODUÇÃO DE PROVAS


Roberto Portugal Bacellar
Juiz de Direito – Poder Judiciário do Paraná
Resumo

No Brasil há um ensino jurídico moldado pelo sistema da contradição (dialética) que forma guerreiros, profissionais combativos e treinados para a guerra, para a batalha, em torno de uma lide, onde duas forças opostas lutam entre si, colhem provas de suas versões e, no final, só pode haver um vencedor (modelo heterocompositivo). Todo caso tem dois lados polarizados. Quando um ganha, necessariamente o outro tem de perder.

No modelo autocompositivo, de regra confidencial e sigiloso, não haverá preocupação com provas e se a tentativa de conciliação resultar infrutífera nada do que foi conversado será consignado ou repassado ao magistrado.
  1. Fundamentação
    
O atual processual brasileiro incentiva e estimula (a qualquer tempo), mas também ao início da instrução e julgamento (solução heterocompositiva), a tentativa de conciliação entre as partes (solução autocompodositiva). Vimos também ser costume do operador do Direito já armado para a batalha, segundo o prisma heterocompositivo, buscar a todo o custo os elementos de prova que fortaleçam sua posição no processo. Essa premissa é verdadeira para o processo heterocompositivo: onde serão necessárias todas as provas a fim de que o juiz possa decidir. Quando se trata de processo autocomposiivo (onde a solução é dos interessados), não deve haver qualquer preocupação com produção de prova e a doutrina autocompositiva recomenda como fundamental o sigilo sobre tudo que foi conversado. Caso os interessados não encontrem uma solução, esquece-se o que foi tratado na fase autocompositiva e aí sim cada parte vai procurar produzir provas que demonstrem a veracidade de suas alegações. Os operadores do Direito o Brasil muitas vezes pretendem que o teor da conversa no ambiente autocompositivo seja utilizado como prova e requerem que fique consignado no termo propostas, confissões, desabafos que possam fortalecer seus argumentos jurídicos. Fecho parênteses que teve o objetivo de registrar a incongruência, neste ponto específico, entre a doutrina jurídico-processual voltada para o processo judicial heterocompositivo e a doutrina de visão interdisciplinar/transdisciplinar que fundamenta o processo autocompositivo.
    2. Conclusão objetiva

Quando se trata de processo autocompositivo (onde a solução é dos interessados), não deve haver qualquer preocupação com produção de prova e sim com a pacificação.
Se a paz é a razão da existência do Poder Judiciário, só quando ela não for alcançada diretamente pelas partes em uma negociação, conciliação ou mediação é que se tornará necessária a solução heterocompositiva, onde a busca de provas é necessária para instruir a decisão do juiz nos autos do processo.

Formar prova ou tentar registrar o que for consignado na audiência de conciliação é contraproducente e inadequado ao modelo autocompositivo e consensual.

Extraído da Revista da Escola Nacional da Magistratura - Ano VII, ed. no. 6 – Brasília: Escola Nacional da Magistratura, [2012], p.91/92.

03 maio 2013

EXECUÇÃO DE MULTA COMINATÓRIA EXIGE PRÉVIA INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR

 
O blog publica às sextas-feiras decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos julgados nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências. Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns, onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.
Hoje a questão versa sobre execução de multa cominatória (astreintes),  nos termos abaixo:

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 196/04

D E C I S Ã O

O autor, devidamente qualificado e representado por seu ilustrado patrono, impetrou o presente “mandamus” contra ato acoimado ilegal praticado MM Juiz do 4º Juizado Especial Cível de Vila Velha que não deu seguimento à execução de multa cominatória nos autos de ação de rito especial tombada sob o nº 023.510.060.742 (6074-2), violando direito líquido e certo do impetrante.

Aprecio o pedido de liminar.

Aponta o impetrante como hostilizada a decisão de fls. 184, com o seguinte teor:
 
Razão assiste à parte executada. Para haver execução da multa, o Juiz deveria fixar o prazo de incidência da mesma, concedendo prazo razoável para cumprimento do preceito, ou seja, do comando da sentença de fls. 117. Este é o entendimento da doutrina e da jurisprudência e também do Colegiado Recursal deste Estado. Assim, considerando que já houve fixação de prazo para cumprimento, fica pois, prejudicada a execução do valor de R$ 19.200,00.”
 
Tal decisão afigura-se-me prenhe de razoabilidade, mormente porquanto nas obrigações de fazeer ou não fazer a multa tem por escopo forçar o cumprimento do julgado e exige, ainda, intimação pessoal da parte para tal desiderato, nos termos da jurisprudência pátgria.
 
Nessa linha, a decisão proferida no processo 20010060000726 da Segunda Turma Recursal Cível de Brasília, com base em julgado do TJDF, cujo excerto, na parte que importa, transcrevo:
3.5 A INTIMAÇÃO PESSOAL, NESTE CASO, DEVE SER FEITA PESSOALMENTE PORQUE COMPARECE INTRANSMISSÍVEL A OBRIGAÇÃO DO DEVEDOR EM CUMPRIR A OBRIGAÇÃO, E EM CASO DE DESCUMPRIMENTO, AS CONSEQÜÊNCIAS SERÃO POR ELE SUPORTADAS E NADA PODERIA ALEGAR QUANTO À EXIGIBILIDADE DA MULTA. 4. JURISPRUDÊNCIA DO EGRÉGIO TJDF. 4.1 " I- AS ASTREINTES SERVEM DE REFORÇO AO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES DE FAZER, CONSTITUINDO-SE NUM DOS MEIOS SANCIONATÓRIOS DE QUE DISPÕE O ESTADO PARA FAZER CUMPRIR A ORDEM JURÍDICA, REALIZANDO FUNÇÃO INTIMIDATIVA. II- SE É PESSOAL A OBRIGAÇÃO IMPOSTA NA SENTENÇA NECESSÁRIO SE FAZIA A INTIMAÇÃO PESSOAL DO APELADO, PARA QUE, A PARTIR DA DATA DA JUNTADA DO MANDADO EFETIVAMENTE CUMPRIDO, FOSSE CONTADO O PRAZO DE SESSENTA DIAS FIXADO PARA O CUMPRIMENTO DO JULGADO. III- A SIMPLES PUBLICAÇÃO NO DIÁRIO DA JUSTIÇA, BEM COMO A RETIRADA DOS AUTOS, NÃO TEM O CONDÃO DE SUBSTITUIR A INTIMAÇÃO PESSOAL, MÁXIME PORQUE, ADOTANDO TAL ENTENDIMENTO, PREJUÍZOS ADVIRIAM AO APELADO, O QUE NÃO É PERMITIDO ANTE O SISTEMA DE NULIDADES QUE ENVOLVE A LEI PROCESSUAL CIVIL EM VIGOR." (APELAÇÃO CÍVEL 51.751/99, RELATADO PELA ENTÃO DESEMBARGADORA NANCY ANDRIGHI).

Não há nos autos comprovação de intimação do devedor, sabendo-se ainda que a multa processual – que é de natureza pública - não faz coisa julgada, podendo ser retirada ou ajustada em qualquer fase ou grau de jurisdição.
 
Demais disso, para a concessão de medida liminar em ação mandamental devem concorrer os dois requisitos legais, quais sejam, a relevância dos motivos em que se estriba a inicial e a possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação ao direito do impetrante, caso deferida a segurança ao final.
 
Não se desincumbiu de demonstrar o impetrante a ocorrência de fumus boni iuris e nem do periculum in mora, pressupostos necessários à concessão da liminar pleiteada e nem vislumbro nos autos razões para tal desiderato. 

A decisão monocrática está legalmente embasada e eventual demora em ação de rito tão célere não causa dano irreparável ou de difícil reparação ao impetrante.
 
Assim sendo, indefiro a liminar requerida.
 
Intime-se o impetrante desta decisão, bem como para promover a citação do litisconsorte passivo necessário, em cinco dias, sob as penas da lei, desnecessária a retirada dos autos da Secretaria. Atendido, cite-se, requisitem-se as informações e abra-se vista ao Ministério Público.
 
Caso contrário, decorrido o prazo, certifique-se e voltem conclusos.
 
Diligencie-se.
 
Vitória, 08 de novembro de 2004.
 
Juiz Relator

ADENDO:

A lei:

Estabelece o Código de Processo Civil:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

;;;
§ 4o O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)
...
§ 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial. (Redação dada pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)
§ 6o O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva. (Incluído pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)

A doutrina:

A multa cominatória ou multa diária (astreinte) tem por finalidade forçar o devedor a cumprir a decisão judicial que lhe foi imposta.

No abalizado magistério de Eduardo Talamini:
              “A ordem emitida pelo juiz far-se-á acompanhar de mecanismos coercitivos. Assim, o §4º do art. 461 autoriza expressamente a imposição de multa diária, até de ofício, para o caso de descumprimento do comando judicial contido na sentença ou na decisão que antecipe a tutela. Trata-se de instrumento destinado a induzir o réu a cumprir o mandado. Não tem caráter ressarcitório ou compensatório. Já não bastasse antes existir sólida doutrina descartando-lhe a finalidade indenizatória, o §2º do art. 461 veio a confirmar essa orientação: ‘a indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa ‘. Enquadra-se esta entre as ‘medidas indutivas negativas’ (coercitivas) (…). Na dicção tradicional, é meio de ‘execução indireta’.” (Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer e sua extensão aos deveres de entrega de coisa, 2a ed. São Paulo: revista dos Tribunais, 2003, p. 239-240).
   
Também a propósito do tema dissertam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery:
Pena pecuniária (astreintes). Não há limites para a fixação da multa, e sua imposição deve ser em valor elevado, para que iniba o devedor com intenção de descumprir a obrigação. O objetivo precípuo das astreintes é compelir o devedor a cumprir a obrigação e sensibiliza-lo de que vale mais a pena cumprir a obrigação do que pagar a pena pecuniária. A limitação da multa nada tem a ver com enriquecimento ilícito do credor, porque não é contraprestação de obrigação, nem tem caráter reparatório. Contudo, parcela significativa da doutrina e da jurisprudência entende que ela não pode ultrapassar o valor da causa, porque isto poderia significar enriquecimento injusto do credor. Há entendimento no sentido de que, para sua fixação, deve-se aplicar, por analogia, o CC 920”. (Código de Processo Civil Comentado, 3ª ed., São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1997, p. 851).

A Jurisprudência:

O Superior Tribunal de Justiça, por sua Quarta Turma, adota o mesmo posicionamento como revela o Informativo no. 0479, correspondente ao período de 27/06 a01/07/2011, nos termos que seguem (Grifei e negritei o ponto a que se refere a decisão acima):
 
EXECUÇÃO. MULTA COMINATÓRIA. JUIZADOS ESPECIAIS.
Na origem, a sociedade anônima do ramo de seguros de saúde (a seguradora recorrente) impetrou mandado de segurança (MS) contra o não provimento de recurso inominado proferido por turma recursal cível e criminal dos juizados especiais. Sustentou a seguradora não haver recurso cabível contra o ato judicial coator e, entre outros argumentos, afirmou que, após ter sido condenada no juizado especial estadual ao pagamento de danos materiais e morais, em ação indenizatória movida pela litisconsorte passiva necessária (segurada), a execução do valor da multa cominatória imposta, em fase de cumprimento de sentença, ultrapassou o valor de alçada fixado em 40 salários mínimos pela Lei n. 9.099/1995, o que tornou incompetente o juizado para processar a execução. Agora, no recurso em mandado de segurança (RMS), a seguradora insiste nas mesmas alegações. Para a Min. Relatora, antes de definir se a multa cominatória no juizado especial pode exceder o valor de alçada exigido em lei, deve-se primeiro observar que, nesses casos, a Corte Especial já estabeleceu que o exame do MS no TJ está restrito à definição da competência do juizado especial em contraposição à definição da competência da Justiça comum, não cabendo ao TJ enfrentar as questões de mérito decididas no juizado especial. Anotou ainda que, em relação à questão da competência dos juizados especiais, quando o valor de alçada for superado pelo da execução ou cumprimento de sentença, há precedentes da Terceira e Quarta Turma deste Superior Tribunal nos quais se estabeleceu ser competente o próprio juizado especial cível para a execução de suas sentenças independentemente do valor acrescido à condenação. Dessa forma, para a Min. Relatora, apesar de o valor da alçada ser de 40 salários mínimos calculados na data da propositura da ação e, quando da execução, o título ostentar valor superior em razão dos encargos inerentes à condenação (como juros, correção monetária e ônus da sucumbência), tal circunstância não altera a competência dos juizados especiais para a execução da obrigação reconhecida pelo título, pois não poderia o autor perder o direito aos encargos decorrentes da demora na solução da causa, no entanto o tratamento deve ser diferenciado na multa cominatória. Expõe que a multa cominatória, por se tratar de obrigação de fazer cujo cumprimento é imposto como pena de multa diária, incide após a intimação pessoal do devedor para seu adimplemento e o excesso desse quantum em relação à alçada fixada pela mencionada lei só pode ser verificado na fase de execução, não existindo possibilidade de controle da competência do juizado especial na fase de conhecimento. Por esse motivo, a Min. Relatora afastou a preclusão alegada pelo acórdão recorrido como obstáculo para a concessão da segurança. Também explica que afastou a incompetência do juizado especial, visto que, no caso, não há dúvidas de que a execução deve prosseguir naquele juízo especial, pois o valor da causa e a condenação por danos materiais e morais imposta pela sentença situaram-se em patamar inferior à alçada exigida na lei. Assim, a seu ver, uma interpretação sistemática dos dispositivos da Lei n. 9.099/1995 conduz à limitação da competência do juizado especial para cominar e executar as multas coercitivas (art. 52,V) em valores consentâneos com a alçada respectiva, o que deve ser aplicado por analogia à multa cominatória. Asseverou que, se a obrigação é tida pelo autor, no momento da opção pela via do juizado especial, como de "baixa complexidade", a demora em seu cumprimento não deve resultar em valor devido a título de multa superior ao valor da alçada. Anotou, ainda, que, para a jurisprudência do STJ, o valor da multa diária cominatória não faz coisa julgada material; pode, portanto, ser revisto a qualquer momento, no caso de se revelar insuficiente ou excessivo, conforme dispõe o art. 461, § 6º, do CPC. Logo, para a Min. Relatora, o valor executado a título de multa excedente à alçada deve ser suprimido, sem que esse fato constitua ofensa à coisa julgada. Concluiu que os atos executórios devem visar ao pagamento da obrigação principal (o qual é limitado pelos arts. 3º, I, e 39 da citada lei em 40 salários mínimos na data da propositura da ação), acrescidos dos seus acessórios posteriores ao ajuizamento (juros, correção e eventualmente ônus da sucumbência) e mais a multa cominatória que deve ser paga até o limite de outros 40 salários, na época da execução, sendo decotado o excesso (mesmo após o trânsito em julgado). Observou, por fim, que, se a multa até esse limite não for suficiente para constranger o devedor a cumprir a sentença, sobra ao credor, que livremente optou pelo via do juizado, valer-se de outros meios (notitia criminis por desobediência à ordem judicial ou ajuizamento de nova ação perante a Justiça comum) ou poderia até ensejar outra indenização. Com esse entendimento, a Turma deu provimento ao recurso. Precedentes citados: RMS 17.524-BA, DJ 11/9/2006; RMS 27.935-SP, DJe 16/6/2010, REsp 691.785-RJ, DJe 20/10/2010, e AgRg no RMS 32.032-BA, DJe 23/9/2010. RMS 33.155-MA, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 28/6/2011.