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21 outubro 2011

PLANO DE SAÚDE NÃO PODE NEGAR ATENDIMENTO DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIA



O blog publica às sextas-feiras decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos julgados, até mesmo por questão de espaço, e nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências. Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns, onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.

Hoje o caso tratado é sobre plano de saúde, como segue:

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 0142/04
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. PLANO DE SAÚDE. EXIGÊNCIA DE CARÊNCIA. SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA. ILEGALIDADE.
1.   NA AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL PARA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ADEQUADO ABRE-SE ESPAÇO PARA A PARTE ALCANÇAR O DESIDERATO ATRAVÉS DE OUTRA MEDIDA JUDICIAL COMO O MANDADO DE SEGURANÇA.
2.   A LEI Nº 9.656/1998 QUE DISPÔE SOBRE OS PLANOS E SEGUROS PRIVADOS DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE SÓ ADMITE CARÊNCIA PARA CASOS DE EMERGÊNCIA EM PRAZO MÁXIMO DE 24 HS (VINTE E QUATRO HORAS).
3.   DESSE MODO, NÃO HÁ QUE SE ACOIMAR DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER O ATO JUDICIAL QUE CONCEDE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA EM AÇÃO ORDINÁRIA PARA POSSIBILITAR ATENDIMENTO DE EMERGÊNCIA A USUÁRIO DE PLANO DE SAÚDE.
4.  ORDEM MANDAMENTAL DENEGADA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, ES, à unanimidade, denegar a ordem exarada, nos termos do voto do Relator, que deste passa a fazer parte integrante. Custas, pelo impetrante.
Vitória,ES,   de dezembro de 2004       

R E L A T Ó R I O

Operadora de Plano de Saúde impetrou o presente “mandamus” contra ato do Exmo.Sr. Juiz de Direito do 2º Juizado Especial Cível de Vitória, que, em ação ordinária com pedido de tutela antecipada, deferiu pedido de usuário de plano de saúde para realização de exame de cateterismo decorrente de atendimento de emergência.
Pleiteou medida liminar que foi indeferida pela decisão de fls. 60/61, de minha lavra, pelos motivos ali assentados.

Requisitadas as informações, prestou-as a autoridade indigitada coatora a fls. 64/66, aduzindo que: “analisando a prova documental acostada, em cotejo com os preceitos da Resolução Consu nº 13 e os artigos 12,V “c” c/c 35-C,II da Lei nº 9.656/98 este órgão entendeu, mediante cognição sumária inerente àquela fase procedimental, estarem atendidos os requisitos para a concessão liminar da tutela”.
O douto órgão ministerial, através de parecer de fls. 68/70, da lavra do Dr. Promotor de Justiça, com fundamento na legislação aplicável e transcrevendo pertinentes arestos, concluiu que a decisão afrontada por mandado de segurança não merece retoques, pois proferida com equilíbrio e acerto, razão porque opinou por sua denegação.
É o relatório.


                        V O T O

Bem se sabe que no procedimento traçado pela Lei dos Juizados Especiais o legislador, propositadamente, deixou de prever a possibilidade de recurso no que respeita aos atos judiciais de conteúdo decisório que não impliquem em julgamento do feito. Isso em razão dos princípios que inspiraram esses juizados: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, referidos no artigo art. 2º da Lei nº 9.00/95. 
        
Sabe-se, também, que, em certas circunstâncias, a doutrina e a jurisprudência têm admitido o mandado de segurança contra ato judicial, de modo a evitar a ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação para a parte ou que tenha sido praticado com flagrante ilegalidade ou abuso de poder.
Com a autoridade conferida pela comunidade jurídica brasileira, colhe-se do magistério de HELY LOPES MEIRELLES em sua clássica obra sobre Mandado de Segurança a seguinte lição: “os Tribunais têm decidido, reiteradamente,  que é cabível mandado de segurança contra ato judicial de qualquer  natureza  e  instância,  desde  que ilegal e violador de direito líquido e certo  do impetrante e não haja possibilidade de coibição eficaz e pronta pelos recursos comuns”.

No caso dos autos, a impetrante, na qualidade de operadora de plano de saúde, pretende a anulação do ato praticado pelo magistrado impetrado para desobrigá-la de cobrir os custos dos procedimentos cirúrgicos e de internação solicitados pelo usuário até final sentença na ação ordinária por ele interposta.

A lei que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde – Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998, assim regula a matéria:

        Art. 12.  São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:: (Redação dada pela MPV nº 2.177-44, de 24.8.2001).
        V - quando fixar períodos de carência:
            ...
        c) prazo máximo de vinte e quatro horas para a cobertura dos casos de urgência e emergência;(Alínea incluída pela MPV nº 2.177-44, de 24.8.2001)

Portanto, em casos de urgência e emergência, o prazo máximo previsto em lei para carência é de vinte e quatro horas.

A proposta de adesão ao plano se deu em 01 de agosto de 2004, conforme documentos de fls. 26/30 e a internação hospitalar ocorreu em 18/10/2004, ou seja, mais de 60(sessenta) dias após firmado o contrato de adesão. Não poderia, pois, a impetrante negar-lhe atendimento sob a sob o fundamento de que ainda estava cumprindo carência.

De se registrar que a internação do usuário se deu em função de emergência decorrente de quadro diagnosticado como de síndrome coronariana aguda devido a angina instável.  

A situação do usuário era daquelas caracterizadas como de emergência e como tal não submetida a qualquer carência, conforme expressa disposição da lei dos planos de saúde, “verbis”:

        Art. 35-C.  É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos: (Artigo incluído pela MPV nº 2.177-44, de 24.8.2001)
        I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente; e (Inciso incluído pela MPV nº 2.177-44, de 24.8.2001)

Em situação semelhante, assim decidiu o Colendo STJ:

Processo: RESP 222339 / PB ; RECURSO ESPECIAL 1999/0060893-3
Relator(a): Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR (1102)
Órgão Julgador: T4 - QUARTA TURMA
Data do Julgamento: 28/06/2001
Data da Publicação/Fonte: DJ 12.11.2001 p. 155
Ementa
PLANO DE SAÚDE. Prazo de carência. Internação de urgência. O prazo de carência não prevalece quando se trata de internação de urgência, provocada por fato imprevisível causado por acidente de trânsito. Recurso conhecido e provido.

Assim sendo, o ato judicial atacado, como bem acentuou o douto Ministério Público, não padece de qualquer retoque.

Daí, entendo que a decisão judicial, proferida por Juiz competente em processo válido e regular, não é ilegal nem abusiva a merecer qualquer reparo pela via eleita. Ademais, a decisão judicial teve por escopo garantir o atendimento médico-hospitalar adequado ao usuário que corria sério risco de vida se não fosse atendido imediatamente.

Em face do exposto, denego a ordem mandamental exorada.

É como voto.

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